Ex-franqueados estão acionando a L’Oréal na Justiça após terem se sentido lesados ao investirem em quiosques da Maybelline. É o caso dos sócios Henrique Faria e Donato Carvalhaes, que começaram a investir no modelo de franquias da marca em 2013 e chegaram a ser os maiores franqueados do Brasil, com 19 operações. Porém, uma sucessão de problemas fez o negócio começar a degringolar quatro anos depois. Hoje, um grupo de 25 ex-franqueados também enfrenta as mesmas dificuldades com a empresa, o que já resultou no fechamento de mais de 100 quiosques da Maybelline/L’Oréal em todo o Brasil.
“A nossa expectativa no começo se concretizou, as operações faturavam cerca de R$ 100 mil por mês com um bom lucro. Mas a L’Oréal tirou o nosso direito de decisão sobre nosso negócio e de mantê-lo saudável. Isso começou em 2017, com a alteração da diretoria e a chegada de novos membros, quando as diretrizes na gestão do negócio foram diametralmente alteradas. Com isso, problemas mais graves começaram a surgir e/ou se intensificar por atos de responsabilidade exclusiva da L’Oréal”, explicam Faria e Carvalhaes.
De acordo com os sócios, os problemas enfrentados eram: adoção de práticas violadoras do princípio da boa-fé; exploração da dependência econômica sobre os franqueados, aumentando o preço dos produtos de forma exorbitante; falta/ruptura sistêmica de produtos; abuso de direito; concorrência desleal; e desequilíbrio econômico-financeiro, acarretando desvinculação do fim pretendido com a celebração do contrato original.
Os sócios explicam que, conforme os problemas apareciam, eram feitas tentativas de solucioná-los junto à marca, mas sem sucesso. “Fizemos várias tentativas de acordo, todas elas devidamente documentadas, mas a L’Oréal não teve interesse. Foi quando, depois dessas tentativas, iniciamos o processo. A situação ainda foi agravada pela Diretora de Franquias que, para nos prejudicar, orientou franqueados atuais – os enganando também – a ficar com nossas operações após o nosso fechamento”, revelam.
OUTROS CASOS
Quem também enfrentou problemas parecidos com a marca foi Maíra Chebabe. Depois de abrir seu primeiro ponto de venda (PDV) da Maybelline/L’Oréal em 2014, em Campos dos Goytacazes (RJ), Maíra partiu para a expansão de seu negócio, abrindo mais três unidades no Rio de Janeiro e assumindo uma operação própria da L’Oréal no Norte Shopping, na capital do estado.
“Paguei um alto preço e assumi a operação, que era a maior deles no Rio e muito custosa. Assumi na intenção de faturar um valor prometido que eu nunca consegui atingir; tinha um custo alto, a manutenção de tudo era muito alta, tinha que ter um fluxo de caixa forte. Para piorar, a L’Oréal já vinha há um tempo com um problema de portfólio e alguns produtos que eram carro-chefe começaram a ser descontinuados. Esses produtos eram os que mais vendiam, e a reposição não era feita na mesma proporção. Isso foi piorando ao longo do tempo”, conta.
Diante das reclamações dos franqueados, a L’Oréal promoveu uma mudança na equipe que geria o sistema de franquias, trazendo novas promessas de mudanças e melhorias para os parceiros. “Parecia que a coisa ia caminhar, até que a gente viu que os produtos eram descontinuados e não eram mais repostos. Aí veio a pandemia e o que estava ruim ficou muito pior. Não só os produtos não chegavam para nós, mas também a L’Oréal passou a investir no on-line, concorrendo diretamente com a gente. As franquias passaram a ser meras vitrines para eles apresentarem o produto ao cliente e venderem com desconto no on-line. Essa concorrência aconteceu de forma avassaladora”, conta a empresária.
PROMESSAS NÃO CUMPRIDAS
Maressa Birro é outra ex-franqueada da L’Oréal que se sente lesada pela empresa. Em 2015, dois anos após um primeiro contato infrutífero entre ela e a Maybelline, a marca a procurou novamente, dessa vez para assumir uma operação que não estava dando resultados. “Eles disseram que o franqueado estava tendo muitos problemas com a franqueadora e que precisavam de outro franqueado que abrisse pelo menos dois PDV. Eu insisti muito para ser um só, mas eles afirmaram que tinha que ser dois. Nem tinha shopping para isso na cidade e me mandaram para outra cidade, prometendo ótimos resultados. Moral da história: abri em dois shoppings e, nesse que prometeram tudo, eu não consegui ganhar nem 1 real com o quiosque, eu tirava dinheiro do outro para pagar as contas dele”, revela.
De acordo com a empresária, além das expectativas frustradas, os problemas com a franqueadora eram diversos. “Eles prometiam lucratividade de 15 a 20% do faturamento, apresentavam dados de valor de venda que não sabemos como calculavam. A nossa primeira compra, por exemplo, tinha que ser feita por eles e a minha foi só de produtos que não vendiam, coisas que estavam saindo de linha. Era muito amadorismo e falta de capacitação. Chegou um momento que nós, franqueados, começamos a fazer o negócio. Pagávamos royalties, mas a gente que fazia tudo e nada do que eles prometiam era cumprido”, diz.
Outro grande problema era a concorrência desleal da própria Maybelline/L’Oréal. “Nunca houve uma equalização de preços, a compra no quiosque sempre foi muito mais cara. Além de ser muito mais caro, existem produtos que os franqueados não têm, que só estão disponíveis nos parceiros on-line da marca. E os produtos são muito mais baratos nesses locais, com frete grátis, brindes, e aí o pessoal não consegue nem concorrer com si próprio, porque o cliente prefere comprar pela internet”, diz.
CONSEQUÊNCIAS
Como resultado de todos esses problemas enfrentados pelos ex-franqueados, Maíra e Maressa revelam que já houve mais de 60 fechamentos de operações nos últimos anos, totalizando mais de 100 quiosques da Maybelline/L’Oréal com as atividades encerradas e dezenas de franqueados prejudicados em todo o Brasil.
“Quase todos foram indenizados no desespero por causa das dívidas contraídas. Eles aceitaram uma negociação por valores irrisórios, porque estavam desesperados. No meu caso e de algumas outras pessoas, a gente ficou numa situação pior, pois tínhamos muitas operações. Eu cheguei a ter seis operações, contraí muitas dívidas. Passei a dever o banco e a ter vários problemas”, revela Maíra.