Por Natália Brito
A Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, não foi apenas uma mudança de regime político; marcou também uma transformação na arquitetura e urbanização brasileiras. Com a queda da monarquia e o advento da República, o país buscava se alinhar aos ideais modernos e democráticos, refletindo essas aspirações em sua paisagem construída.
A transição para a República impulsionou uma série de mudanças na arquitetura, que passaram a refletir, na linguagem visual dos edifícios, os valores de uma nova identidade nacional.
O final do século XIX e início do XX foram períodos de grande expansão urbana nas principais cidades brasileiras, sobretudo no Rio de Janeiro, que, como capital, se tornou o palco das transformações republicanas.
Inspirados pelos ideais republicanos e pela busca de modernização, políticos e urbanistas buscavam criar uma imagem de progresso. Esse desejo se manifestava em reformas urbanas e em uma nova linguagem arquitetônica que rejeitava elementos coloniais e monárquicos, incorporando características do ecletismo e do neoclassicismo, estilos então associados ao desenvolvimento europeu.
Esse movimento foi especialmente visível durante a gestão do prefeito Francisco Pereira Passos (1902-1906) no Rio de Janeiro, que promoveu um amplo programa de reurbanização inspirado em Paris, conhecida como a “cidade-luz”. As reformas de Pereira Passos transformaram o centro da cidade, criando avenidas largas e novas edificações públicas em estilos eclético e neoclássico, como o Theatro Municipal. Esse estilo arquitetônico buscava refletir uma ordem e um ideal de civilidade próprios de uma sociedade republicana e moderna.
O ecletismo, por sua vez, representava a miscigenação cultural e a adaptação de estilos europeus ao contexto brasileiro, algo que se conectava com o espírito inclusivo que o novo regime desejava transmitir.
Em cidades como São Paulo, Belo Horizonte e Recife, a arquitetura também passou a expressar esses valores republicanos, misturando características clássicas com adaptações locais. Esse período marca o início do rompimento com as casas coloniais e com os casarões aristocráticos, que simbolizavam a antiga ordem monárquica, e trazia em seu lugar uma arquitetura voltada para edifícios públicos que servissem o povo.
A República, além de modificar o urbanismo, trouxe mudanças na função dos espaços. Muitas praças e monumentos surgiram para homenagear figuras importantes da política e da independência nacional, como as estátuas de Tiradentes e de outros heróis republicanos. Esse simbolismo ajudava a fortalecer a nova identidade brasileira, que buscava seus heróis em figuras do povo, ao invés de nobres e monarcas.
A Proclamação da República foi um divisor de águas para a arquitetura brasileira. Ela redefiniu os valores e o imaginário urbano, utilizando a arquitetura como uma ferramenta de construção da identidade republicana.
Hoje, os edifícios e monumentos desse período, espalhados pelo país, permanecem como vestígios do espírito republicano que marcou o fim do século XIX. Ao olhar para essa arquitetura, somos lembrados de que, além das revoluções políticas, as cidades também se reinventam para expressar seus novos ideais.
Natália Brito é arquiteta e professora mestre, com 15 anos de experiência na área de projetos e 12 anos dedicados à educação. Ela possui a Formação DAP (Desenvolvimento Avançado de Projetos) e é cofundadora da Arqcalc, uma startup de Precificação de Projetos. Através de plataformas digitais, mentora milhares de profissionais da Arquitetura e Design, ajudando-os a aprimorar suas práticas e gestão.