Por Ricardo Ramos (*)
A participação política é uma das engrenagens mais fundamentais para o fortalecimento da democracia, e o papel da classe média nesse processo é estratégico. Historicamente, a classe média possui uma posição singular: está próxima tanto das classes mais altas quanto das mais baixas, e sua diversidade lhe permite identificar necessidades e pontos de conexão em toda a sociedade. No Brasil, um país marcado por desigualdades sociais e um cenário político instável, a classe média tem, atualmente, uma responsabilidade ainda mais destacada. Mas, afinal, como esse grupo pode contribuir para a construção de um país mais justo e democrático?
Discutiremos como a classe média brasileira pode exercer sua cidadania e influenciar positivamente o sistema político. Exploraremos as oportunidades de participação disponíveis e os desafios a serem superados, refletindo sobre o impacto desse engajamento nas transformações sociais e econômicas do Brasil.
A classe média brasileira é composta por um grupo diverso que abrange desde pequenos empresários e profissionais liberais até funcionários públicos e trabalhadores qualificados. Este grupo, ao longo das últimas décadas, experimentou uma ascensão social significativa, impulsionada pelo crescimento econômico, pela democratização da educação e pela ampliação do acesso ao consumo. No entanto, a crise econômica recente e a pandemia de COVID-19 trouxeram desafios adicionais, ameaçando a estabilidade e os avanços alcançados.
Diante desse cenário, cresce a demanda por uma participação política mais ativa, onde a classe média assume o protagonismo em defesa de direitos fundamentais, melhorias nos serviços públicos e transparência no governo. Em um país onde a desigualdade é um dos maiores entraves para o desenvolvimento, a classe média pode desempenhar o papel de ponte entre diferentes camadas sociais e contribuir para construir um futuro mais equilibrado.
A participação política não se limita ao voto nas eleições. Ela abrange diversas formas de engajamento, como o debate público, a fiscalização de políticas, a mobilização em prol de causas coletivas e a colaboração com movimentos sociais. Cada uma dessas ações ajuda a fortalecer o sistema democrático e traz à tona discussões sobre direitos e deveres de todos os cidadãos.
No Brasil, onde a corrupção e a má gestão de recursos públicos ainda são desafios persistentes, a participação ativa da sociedade é essencial para a responsabilização dos governantes e para a defesa dos interesses públicos. A classe média, ao se envolver mais ativamente nesses processos, contribui para a criação de uma cultura de cidadania mais robusta e atuante. Essa participação é ainda mais significativa em tempos de crise, quando políticas públicas voltadas ao bem-estar social e à redução das desigualdades são frequentemente alvo de corte de verbas.
A classe média brasileira possui um histórico de engajamento em momentos de crise. Manifestações políticas, campanhas contra a corrupção e movimentos em prol de melhorias educacionais e de saúde pública contam frequentemente com a participação significativa desse grupo. No entanto, a verdadeira eficácia da mobilização vai além de atos isolados. É fundamental que haja um comprometimento contínuo e que as reivindicações sejam feitas de forma organizada e objetiva.
Um exemplo recente de mobilização foi a pressão popular exercida nas redes sociais para barrar medidas que prejudicavam o acesso à educação e à saúde pública. A tecnologia e o acesso à informação permitem que a classe média fiscalize e cobre ações dos governantes de maneira mais assertiva. O uso de aplicativos de monitoramento de gastos públicos, por exemplo, é uma maneira de acompanhar onde o dinheiro dos impostos está sendo investido e denunciar irregularidades.
Para que a participação política seja realmente efetiva, a educação política é um componente indispensável. No entanto, o Brasil ainda enfrenta grandes desafios nesse campo. Muitos brasileiros, incluindo aqueles da classe média, não recebem educação política formal e acabam vulneráveis a desinformações ou manipulações. Esse cenário limita a capacidade de compreender as complexidades do sistema e de avaliar criticamente propostas e candidatos.
A classe média, por ter um maior acesso a recursos educacionais e informativos, tem a responsabilidade de buscar essa conscientização e promover uma educação cidadã em suas comunidades. Esse conhecimento é o que possibilita a formação de opiniões fundamentadas e a defesa de interesses coletivos. Escolas, universidades e até mesmo iniciativas comunitárias podem oferecer espaços de discussão para temas políticos, incentivando o pensamento crítico e o debate saudável.
Outra maneira pela qual a classe média pode exercer um papel fundamental na construção do país é por meio da participação em conselhos municipais, associações de bairro e fóruns de discussão locais. Esses espaços são essenciais para discutir problemas cotidianos e propor soluções práticas para questões de segurança, infraestrutura, educação e saúde nas comunidades.
Os conselhos locais são canais diretos de diálogo com a administração pública e permitem que a população contribua com ideias e reivindicações específicas. A participação da classe média nessas instâncias pode ajudar a promover mudanças significativas que impactam diretamente a qualidade de vida, criando um ciclo virtuoso de melhorias na infraestrutura urbana e nos serviços públicos.
Apesar das oportunidades e dos benefícios da participação política, muitos membros da classe média brasileira se sentem desmotivados e descrentes em relação à política, em parte devido aos escândalos de corrupção e à lentidão do processo de mudanças. No entanto, é importante lembrar que a transformação social é gradual e exige perseverança.
Manter o engajamento requer que a classe média adote uma visão de longo prazo, compreendendo que cada esforço, por menor que pareça, contribui para o fortalecimento da democracia. Participar ativamente não é uma garantia de resultados imediatos, mas uma construção coletiva e constante. E, quando essa postura é compartilhada, ela se espalha para outras camadas sociais, gerando um movimento amplo e transformador.
O papel da classe média na construção de um Brasil mais democrático e justo é indispensável. Ao se engajar na política de forma ativa e consciente, a classe média pode influenciar transformações significativas, exigindo mais responsabilidade dos governantes, promovendo o debate público e lutando pela melhoria das condições de vida da sociedade como um todo.
A construção de um país melhor é uma responsabilidade compartilhada e, para isso, é necessário que a classe média encare sua participação política como um dever cívico. No fim, a soma desses esforços individuais é o que, de fato, ajuda a moldar o Brasil que desejamos ver no futuro.
(*) Ricardo Ramos é doutor em Teologia e autor de vários livros