(Por William Saliba)
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) condenou o conselheiro da Usiminas, Luiz Carlos Miranda, por vazar informações sigilosas da companhia em 2019. O representante dos trabalhadores da siderúrgica no conselho de administração foi multado nesta terça-feira (18) em R$ 100 mil.
A reportagem do CARTA DE NOTÍCIAS manteve contato com o conselheiro e solicitou sua posição sobre o assunto, mas apesar de aprazado o horário para sua manifestação, Luiz Carlos Miranda não se pronunciou até o fechamento desta matéria. Entretanto, segundo a Agência Estado, a defesa informou que vai recorrer ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, o Conselhinho.
ENTENDA A CONDENAÇÃO
O processo administrativo da sanção foi instaurado após o conselheiro divulgar projeções negativas para o resultado da Usiminas em 2019, até então não divulgadas ao mercado. De acordo com a Usiminas, os números sigilosos haviam sido discutidos em uma reunião do conselho realizada no dia 5 de setembro daquele ano. Pela Lei das S.A., o administrador de companhia aberta tem “o dever de manter sigilo a respeito de informação interna da companhia à qual teve acesso privilegiado e que possa influenciar as cotações de seus valores mobiliários negociados em bolsa”.
As declarações de Luiz Carlos Miranda, em um evento realizado em 18 de setembro de 2019, foram reproduzidas em edição on line do jornal diário de Ipatinga: “Nós tivemos um trimestre que não foi ideal. Esse ano não vai ser bom para a siderurgia em função do mercado. Só na Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações), devemos perder, em relação ao anterior, mais de R$ 1 bilhão. Então isso é um sinal vermelho, ou seja, uma preocupação para todos nós”.
Diante do vazamento, a Usiminas teve que divulgar Fato Relevante ao mercado no mesmo dia, confirmando a existência de documentos internos com previsões de redução do seu Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortizações) de 2019 em torno de R$ 1 bilhão em relação ao ano anterior.
REINCIDÊNCIA
Na época, a própria companhia fez uma reclamação contra Miranda à CVM. A Usiminas informou ao órgão regulador do mercado de capitais que seu conselheiro já havia divulgado informações sigilosas do grupo em outras ocasiões e inclusive foi notificado por violação ao dever de guardar sigilo sobre informações ainda não divulgadas ao mercado.
Em sua defesa, o conselheiro afirmou que a notícia veiculada no jornal diário de Ipatinga estava equivocada e que foi retificada dias depois. Luiz Carlos alegou que as informações sobre os números e projeções da Usiminas foram prestadas por “um empresário” presente ao encontro na Associação Comercial, Industrial, Agropecuária e de Prestação de Serviços de Ipatinga (Aciapi) e Câmara de Dirigentes Lojistas de Ipatinga (CDL) e ele, como membro do conselho, apenas prestou esclarecimentos.
A acusação da CVM, entretanto, argumentou que a notícia não foi divulgada apenas no pelo jornal diário ipatinguense, mas também no site das associações que sediaram o encontro e que a segunda matéria não desmentiu a anterior. Também não houve publicação de uma errata pelo veículo.
REFLEXO EM COTAÇÕES
Relator do caso, o presidente da CVM, Marcelo Barbosa, destacou em seu voto que as projeções têm o potencial de influenciar a decisão de investimento e a cotação das ações das companhias, por isso a CVM exige cuidados em sua divulgação, especialmente em relação às premissas que as fundamentam. “Não há dúvida de que a projeção de redução do Ebitda da companhia para o ano de 2019, na ordem de R$ 1 bilhão, era uma informação relevante para o mercado. Como bem demonstrou a acusação, os resultados parciais da Usiminas não indicavam uma projeção tão negativa como aquela mencionada em 18 de setembro de 2019”, disse Barbosa.
A quebra do dever de sigilo pelo administrador independe de haver prejuízo à companhia, bastando que se comprove que houve divulgação de informação relevante, obtida em razão de cargo de administrador e ainda reservada no momento de sua divulgação indevida.
ACUSAÇÕES ANTERIORES
Essa não é a primeira vez que Luiz Carlos Miranda é acusado de ter se envolvido em um caso polêmico. Em 2018, ele chegou a ser afastado do conselho da Usiminas por decisão da Justiça em ação civil pública movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) contra o conselheiro e a Usiminas. O MPT alegava que a empresa teria fornecido dinheiro de forma ilícita para o sindicato do qual Miranda participa. A liminar, entretanto, acabou sendo revertida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Em fevereiro deste ano, o conselheiro voltou a ser notícia ao enviar uma carta ao colegiado da siderúrgica mineira, apontando que a postergação da reforma do Alto-Forno 3 na Usina de Ipatinga, poderia levar ao aumento de riscos da operação, que já havia registrado acidentes ao longo dos últimos anos. Orçada em cerca de R$ 1 bilhão a reforma foi adiada em um ano, para 2022.