O governo federal desperdiçou cerca de R$ 260 milhões em vacinas Coronavac que venceram ou estão prestes a expirar nos estoques do Ministério da Saúde. A compra de 10 milhões de doses foi realizada em setembro de 2023, quando o imunizante já não era mais a principal opção na campanha de vacinação contra a Covid-19.
O processo de aquisição se estendeu por sete meses, de fevereiro a setembro de 2023, resultando na entrega tardia das doses em outubro. O Ministério da Saúde isentou o Instituto Butantan da obrigação de substituir os lotes com validade inferior ao prazo estipulado no contrato, dias antes da entrega.
Dados obtidos via Lei de Acesso à Informação revelam que aproximadamente oito milhões de doses permanecem no estoque do ministério, todas vencidas ou próximas do prazo de validade. O prejuízo pode ser ainda maior, pois o “vacinômetro” do Ministério da Saúde indica que doses distribuídas aos estados e municípios também perderam a validade.
Desde outubro de 2023, apenas 260 mil unidades da Coronavac foram aplicadas no país, sugerindo que mais de 97% da compra pode ter sido desperdiçada. O Ministério da Saúde não esclareceu por que manteve a aquisição de uma vacina que já estava em desuso no Sistema Único de Saúde (SUS).
A pasta afirmou que a compra foi destinada ao público infantil, visando completar o esquema vacinal de crianças de 3 a 11 anos. No entanto, especialistas questionam a decisão, argumentando que em outubro de 2023 já não era mais recomendado o uso da Coronavac por não estar atualizada para as novas variantes do vírus.
O contrato, o mais volumoso de vacinas da Covid assinado no primeiro ano do atual governo, não foi amplamente divulgado, aparecendo apenas no Diário Oficial da União. Em dezembro de 2023, o ministério alterou as orientações sobre a campanha de imunização, limitando o uso da Coronavac a “situações específicas”.
O Instituto Butantan afirmou que entregou as doses dentro do prazo de validade estipulado pelo Ministério da Saúde. No entanto, documentos mostram que as vacinas tinham entre 38,3% e 43,5% da validade já consumida no momento da entrega, superando o limite de 35% estabelecido no contrato.
A decisão de dispensar a exigência de troca das doses com validade curta foi tomada por e-mail, sem parecer jurídico anexado ao processo. Técnicos da pasta justificaram a medida citando o atraso na aquisição e restrições da Anvisa para a produção de novos lotes.
O governo federal, que elegeu como prioridade a retomada das coberturas vacinais, enfrenta dificuldades para adquirir doses suficientes da vacina contra a Covid-19 para iniciar uma nova campanha nacional de imunização. Em 2023, além da compra da Coronavac, foram feitos apenas aditivos de contratos negociados pela gestão anterior.
Para 2024, o Ministério da Saúde promete entregar 70 milhões de imunizantes, mas até o momento fechou apenas uma compra emergencial de 12,5 milhões de vacinas da Moderna, adaptadas à variante XBB, com entrega prevista para maio. Uma nova licitação para até 69 milhões de doses está em andamento.
O episódio evidencia desafios na gestão e planejamento das compras de vacinas, resultando em significativo desperdício de recursos públicos em um momento crítico para a saúde pública nacional.