*Por Ramon Melo Fontich
A evolução da sociedade por vezes exige a renovação e reinterpretação do direito pelo seu operador; renovação e reinterpretação, todavia, que muitas vezes se efetiva anos depois da evolução da sociedade, quase sempre em razão da rigidez envolta na evolução do direito como um todo.
Não obstante, tais evoluções exigem do judiciário tratamento jurídico adequado e, com o passar dos anos, soluções para uma nova série de conflitos.
Incontáveis são os exemplos, alguns mais emblemáticos que outros, como por exemplo, a reinterpretação do conceito de família pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da ADPF nº 132, em 2011.
Recentemente, tivemos outro exemplo. Ao julgar o Tema nº 492 sob a técnica dos recursos repetitivos, o STF fixou tese acerca das associações de moradores, solução empregada pela sociedade diante da falha do Poder Público em prover questões básicas – especialmente segurança.
Como resposta à ineficácia que é inerente a Administração Pública, empreendedores e membros da sociedade passaram a se organizar legalmente para a realização de um objetivo comum lícito, como por exemplo, a promoção da segurança, bem-estar, lazer, quase sempre com limitação à determinada região, formando as conhecidas associações de moradores, comumente confundidas como condomínios.
Diferentemente do que ocorria com as associações de moradores, os condomínios já encontravam tratamento legal para esse fim, com previsão a partir do art. 1.331 do Código Civil e seguintes, com especial enfoque para o art. 1.336, I, o qual criou obrigação para o condômino, de “contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção”, conhecido como taxa condominial.
Por outro lado, em relação às associações de moradores, a situação é diversa. Primeiramente, até então não havia previsão legal de obrigação de contribuição aos associados. Em segundo lugar, de ordem constitucional, é direito fundamental se associar ou não, conforme art. 5º, XXVII, da CF/88 .
Com isso as associações de moradores, passaram a enfrentar resistência quanto à cobrança de taxa de moradores que não tenham efetivamente se associado, problema que foi objeto de julgamento do Tema nº 492, pelo STF.
Todavia, no decorrer das discussões jurídicas, o legislador ao editar a Lei 13.465/17 equiparou as associações aos condomínios, com alterações tanto na Lei do Parcelamento do Solo (nº 6.766/79), quanto no Código Civil. Assim, ao contar com previsão legal, a cobrança da taxa de associação passou a contar com maior robustez.
Não obstante, apesar da previsão legal, a cobrança de taxa ainda encontrava óbice no art. 5º, XXVII, da CF/88, ou seja, somente seria exigível daqueles que tivessem anuído.
Com essas considerações e, tendo em vista que as fontes das obrigações são invariavelmente a lei ou a vontade das partes, o Supremo consubstanciou que:
“É inconstitucional a cobrança por parte de associação de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado até o advento da Lei 13.465/2017, ou de anterior lei municipal que discipline a questão, a partir da qual se torna possível a cotização dos titulares de direitos sobre lotes em loteamentos de acesso controlado, que: (i) já possuindo lote, adiram ao ato constitutivo das entidades equiparadas a administradoras de imóveis ou (ii) sendo novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação esteja registrado no competente Registro de Imóveis”.
Assim, exsurge duas vertentes para tornar exigível a contribuição de taxa por associado, a partir da vigência da Lei 13.465/17: (i) ele tenha se associado, anuindo ao ato constitutivo da associação; (ii) ao adquirir o imóvel, o ato constitutivo da associação tenha sido registrado no Registro de Imóveis – atribuindo-lhe caráter erga omnes .
Por fim, além dessas hipóteses, salientou-se que é possível a exigência da observância das regras previstas no estatuto da associação, desde que haja Lei Municipal a respeito do tema, na medida que se trata de matéria de competência residual da Municipalidade, cf. art. 30, VIII, CF/88.
(*)Ramon Melo Fontich é advogado com atuação voltada para o contencioso. Possuo experiência em atuação de processos judiciais estratégicos, especialmente nas áreas de direito civil, imobiliário, empresarial e administrativo
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