Por Edmundo Fraga (*)
Recentemente, o empresário Luciano Hang alertou sobre uma “pandemia” que tem afetado muitos de seus colaboradores, especialmente aqueles com mais de 20 anos de casa. Segundo Hang, esses funcionários, endividados principalmente devido aos jogos online, estão pedindo demissão na tentativa de encontrar algum alívio financeiro para quitar suas dívidas. Embora essa situação particular seja um reflexo de um fenômeno mais amplo, não há como ignorar a relação entre essa crise e um dos produtos financeiros mais populares do Brasil: o empréstimo consignado.
Introduzido em 2004, durante o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o empréstimo consignado foi concebido para atender às necessidades de consumo da população, em especial aos aposentados e pensionistas do INSS. Esse tipo de crédito se caracteriza pelo desconto automático das parcelas diretamente na folha de pagamento ou no benefício, o que o torna uma das modalidades de crédito pessoal com os menores juros do mercado.
Segundo dados do Banco Central, em janeiro de 2021, o total de empréstimos consignados atingiu R$ 442,8 bilhões, o maior valor já registrado até aquele momento. Em agosto de 2020, a Folha de São Paulo revelou que havia 34,4 milhões de contratos de empréstimos consignados no país — um número superior ao total de beneficiários previdenciários, que em março de 2021 somavam 31.143.481 pessoas. Indicando que, em muitos casos, os beneficiários possuíam mais de um contrato de empréstimo.
Entretanto, o aumento do acesso a esse tipo de crédito trouxe consigo uma série de problemas. As reclamações começaram a crescer, abordando desde depósitos irregulares até vazamentos de dados pessoais na plataforma “Meu INSS”, onde muitos consignados são desbloqueados. O que deveria ser uma ferramenta de apoio se transformou, para muitos, em uma verdadeira armadilha.
A situação se agrava ainda mais quando consideramos que a maioria dos aposentados e pensionistas recebe o salário-mínimo, vive em condições de vulnerabilidade econômica e, em grande parte, não possui conhecimento técnico para lidar com questões financeiras tão complexas.
Do outro lado, estão as grandes instituições financeiras, potências econômicas que, muitas vezes, agem de forma predatória. Como resultado, muitos idosos passaram a receber empréstimos e cartões de crédito (RMC e RCC) que não solicitaram. Além disso, há relatos de invasões de dados pessoais, com a alteração de números de telefone e e-mails, o que os expõe ainda mais.
E, para agravar a situação, os sindicatos de aposentados, em especial aqueles ligados à CUT e Força Sindical, diante da perda do imposto sindical, passaram a confiscar contribuições de forma desonesta, sem a devida autorização dos aposentados. Esse abuso reforça a sensação de que os mais vulneráveis estão sendo alvo de uma série de práticas financeiras e sindicais que pioram sua já delicada situação.
O objetivo inicial do crédito consignado — facilitar o acesso ao consumo e aliviar as dificuldades financeiras — se transformou, na prática, em um pesadelo para muitos aposentados e pensionistas. O aumento das dívidas, a falta de compreensão sobre o processo e a vulnerabilidade dos beneficiários tornaram esse produto não uma solução, mas um fardo.
Por isso, é urgente repensar o papel do crédito consignado na economia brasileira, especialmente no que diz respeito ao impacto que ele tem sobre os mais vulneráveis. Uma reflexão mais profunda sobre as implicações sociais e econômicas dessa modalidade de crédito é essencial para evitar que mais pessoas se vejam presas em um ciclo de endividamento sem fim. A transparência, a educação financeira e uma fiscalização mais rigorosa são fundamentais para garantir que o crédito consignado cumpra sua função social de maneira responsável, sem prejudicar ainda mais aqueles que já enfrentam dificuldades financeiras.
(*) Empresário do ramo de imóveis e fundador e ex-presidente do Kart Clube de Ipatinga