Por Mário Plaka (*)
Uma briga generalizada foi a revelação traumática de uma nova realidade humana. Enquanto um homem estava caído, inconsciente, dezenas de pessoas filmavam, comentavam, riam e torciam para o vídeo viralizar. Poucos — pouquíssimos — se moveram para ajudar. E é nesse retrato que enxergamos o sintoma mais perigoso da nossa era: a epidemia do individualismo.
Vivemos em um tempo onde o ego substituiu o caráter. Onde o aplauso vale mais do que a consciência. As pessoas estão tão presas às suas próprias opiniões, ao desejo de aparecer, que perderam a capacidade de enxergar o outro como ser humano. Isso não se manifesta apenas nas ruas ou nas redes sociais — está infiltrado dentro das empresas, dentro das famílias, dentro da política.
Quando colaboradores deixam de ver os colegas como gente e passam a tratá-los apenas como funções, cargos ou obstáculos, nascem os ambientes frios, os relacionamentos tóxicos e as culturas fadadas ao colapso. E não é diferente no lar: pais e filhos que não se escutam, casais que se transformam em adversários, famílias que se desintegram por falta de empatia. A sociedade está se desumanizando — e ninguém parece perceber.
Mas é preciso entender que isso não aconteceu por acaso. Há décadas, vem sendo plantada uma ideia perigosa, disfarçada de progresso social: a ideia de que o homem é apenas um objeto, um número, uma peça do sistema. Essa visão nasce de doutrinas que enxergam o ser humano não como indivíduo livre e espiritual, mas como produto das circunstâncias.
Karl Marx foi o principal formulador dessa visão. Ao estudar sua vida, percebe-se um paradoxo: pregava a libertação do homem, mas viveu sustentado por outros, especialmente por sua esposa e amigos próximos. A teoria que prometia igualdade acabou criando uma cultura de dependência, de vitimização e de negação da responsabilidade individual. E o resultado está aí — uma sociedade que se acostumou a terceirizar a culpa, a culpar o sistema, o patrão, o governo, o outro.
Quando o homem perde a referência da própria identidade, ele perde o respeito por si e pelos demais. É o primeiro passo para o caos moral. E onde há caos moral, a empatia morre. A agressividade cresce. A inveja se normaliza. O desrespeito vira rotina.
O episódio da briga foi mais do que um espetáculo lamentável — foi um espelho. Um espelho de uma sociedade doente, que vibra com a queda, que se diverte com a dor, que ri da desgraça. Lembra aquelas pegadinhas antigas, que mostravam pessoas tropeçando, caindo, batendo o rosto no chão — e o público gargalhava? Hoje, a diferença é que as pegadinhas viraram a própria vida real. As pessoas filmam tragédias e acham graça.
No trânsito, a buzina virou xingamento. Na política, o diálogo virou briga. Nas empresas, a colaboração virou competição. E no coração, o amor deu lugar à vaidade.
Às vezes nós vemos as pessoas se agredindo umas às outras na rua, no trânsito, nos estádios de futebol, e preferimos procurar o melhor ângulo com o nosso celular para que possamos receber alguns “likes” e talvez até um reconhecimento maior. Em vez de estendermos a mão àquela família, àquelas pessoas que estão passando por dificuldade, buscamos a imagem perfeita da queda. É cada vez mais comum vermos brigas generalizadas, a falta de afeto e de respeito entre colegas — seja dentro da igreja, da família, nas ruas ou nos estádios. Nós queremos estar com o celular na mão, mostrando a queda de alguém, quando deveríamos estar ajoelhados ajudando a levantá-lo. É hora de revermos esse conceito. É hora de voltarmos a ser gente.
A empatia é o cimento da civilização. Sem ela, tudo desaba — a empresa, a família, a nação.
Antes de culpar o outro, antes de apontar o dedo, olhe para dentro. Pergunte-se: quantas vezes eu mesmo deixei de ser empático? Quantas vezes vi alguém caído e preferi filmar, rir ou ignorar?
A humanidade não se perde de uma vez. Ela se perde um gesto de indiferença por vez.
Mas também pode ser recuperada — um gesto de compaixão por vez.
Que cada um de nós volte a ser gente.
Porque sem empatia, não existe sociedade.
Sem humanidade, não existe futuro.
























