Por Walter Biancardine (*)
A rede de notícias CNN divulgou ontem uma declaração da ministra-chefe da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, a deputada federal Gleisi Hoffmann, afirmando que “pedir anistia antes de julgamento é confessar a gravidade dos crimes”.
Tal como venho afirmando há tempos, e o leitor que me acompanha saberá, é que não se pede anistia para crimes que não foram cometidos, pois isto é entregar “de bandeja” uma confissão de algo ilícito não cometido. Muito falei, muito protestei e sempre insisti na tese de que tais processos deveriam simplesmente ser anulados, dada a imaterialidade dos fatos.
O amigo leitor argumentará que o STF jamais assinaria tal anulação, pois este ato – agora sim – seria a admissão de haver cometido um, digamos, “equívoco”. Somada à tal impossibilidade, ainda há a principal questão, que é a permanência de inocentes encarcerados e afastados de suas famílias, impedidos de prosseguir tratamentos medicinais além de muitos outros horrores, impostos pela atual ditadura de toga.
E contra tais fatos não há argumento: que seja pedida a anistia, pois.
Jair Bolsonaro, a principal força impulsionadora da oposição conservadora, encampou a pauta e convocou as manifestações de ontem (16), tendo outra já marcada para o dia 6 de abril. O que fazer? Ora, façamos o óbvio: nós não defendemos o totalitarismo, o coletivismo, a doença castradora da individualidade que mata mentes e almas da esquerda ditatorial, sempre a exigir obediência cega aos ditames de seus líderes e expurgando divergentes. Não, o conservador pode e deve aceitar divergências de opiniões, se o objetivo final é o mesmo. Não somos uma seita ou, muito menos, uma ideologia.
Se isso nos garante uma inegável legitimidade quanto a organicidade de tudo o que fazemos (sim, vem do desejo direto do povo), por outro lado nos expõe à ação de infiltrados carreiristas – bem o sabemos – e dificulta sobremaneira traçar qualquer estratégia, exatamente pela completa liberdade de pensamentos e opiniões. Haveremos de entender o delicado equilíbrio de seguir um líder – Bolsonaro – mas sem nos reduzirmos ao fanatismo; a experiência das ruas está nos ensinando a formarmos uma militância focada em objetivos, não em disputas por detalhes ou – pior – protagonismo carreirista e oportunista, pois o resultado de tais pseudo-líderes é sempre um só: divisionismo, desunião, racha. Pablo Marçal, João Dória e outros são bons exemplos disso.
Pois tal e delicado equilíbrio, preconizado acima, jamais será alcançado enquanto nos comportarmos desta atual e absurda maneira no campo que mais nos é favorável: as redes sociais, as quais temos hoje pleno domínio. Campeia, nas mesmas, uma injustificável agressividade contra simples opiniões divergentes, prenhes de argumentos ad hominen a desqualificar a pessoa, não seus pensamentos, já que a ignorância acadêmica sempre impera. É uma fúria sem fim, típica de delatores em desespero, a denunciar hipotéticos “infiltrados” – mas, inevitavelmente, pelo bem de suas vaidades e desejos de protagonismo, jamais por algum ideal de país.
E por quê atribuo exclusivamente à vaidade este comportamento primário e desesperado dos conservadores (vá lá), nas redes sociais?
Vamos do início: se há um homem – um único – responsável pela “ressurreição” da direita e, principalmente, do conservadorismo no Brasil, este homem chama-se Olavo de Carvalho. Ele formou, sozinho, uma geração de intelectuais “off road”, fora dos fatais preceitos acadêmicos e embasados plenamente dos princípios socráticos, provocando inclusive a edição de vários livros e de autores que, até então, eram olimpicamente desconhecidos, desconsiderados ou evitados, no Brasil. E mais que isso: além de provocar uma onda de (re) conversões à Igreja Católica, Olavo foi o único filósofo sobre a face da terra – e me corrijam, se eu estiver errado – a ser lido, comentado e citado por motoristas de ônibus, donas de casa, torcedores de futebol – gente comum, enfim.
Como ele conseguiu isso? Graças à sua presença nas redes sociais, em forma de recortes de vídeos do COF, de entrevistas ou simples postagens, comentando os acontecimentos. Para tanto, suponho que Olavo tenha seguido os conselhos do cantor Milton Nascimento, que dizia que “o artista tem de ir aonde o povo está” – resultando daí uma cômica definição que o situava como “um cruzamento de Dercy Gonçalves com Sócrates”.
Olavo falava palavrões, toneladas deles. Era indecente, mas contundente. Por vezes obsceno, mas verdadeiro. E o choque que tal linguagem nos provocava igualmente nos fazia entender, sem rodeios, todas as verdades – filosóficas inclusive – que ele desejava passar. Ele foi aonde o povo está, nos atingiu e abriu caminho para o surgimento de Jair Bolsonaro, que espalhou formidavelmente o conservadorismo, Brasil a fora.
Sim, Olavo é um sucesso. E sim, Olavo tem razão.
O problema, entretanto, jamais foram os modos de nosso amado filósofo, mas o irrefreável desejo brasileiro de “macaquear”, imitar descaradamente Olavo, na esperança (sabe-se lá) de sucedê-lo ou de, ao menos, adquirir idêntico poder de convencimento de nosso velho da Virgínia. E tal peste espalha-se, até os dias de hoje e de forma endêmica, nas redes sociais.
Alguns youtubers de renome ainda insistem em plagiar os impropérios olavianos, por mais que sejam qualificados e plenos de boas coisas para nos passar. Para piorar, tais modos – poderosamente auxiliados pela providencial covardia de estarmos, todos, protegidos atrás de uma tela de computador – foram plenamente adotados por aqueles “delatores” afoitos, ansiosos pelo protagonismo, que citei alguns parágrafos acima. E esta é a receita perfeita para se destruir, pela desunião e desconfiança mútua, o movimento conservador brasileiro.
Se assim se comportam por verdadeira malícia ou trata-se apenas de uma porca vaidade, não saberei dizer. O que sei é a realidade que vejo, do resultado de seus “gritos histéricos” e desbocados, os quais tiveram o poder de esvaziar – ainda que uma pequena parte – as manifestações de ontem.
Estúpidos de um lado, xingando e exigindo atenção, e estúpidos de outro, a crer em tais falácias e permanecerem perfeitamente omissos, em suas casas.
Ainda temos um longo e doloroso caminho a percorrer.