Por Amauri Meireles (*)
A (in)segurança na sociedade brasileira tem sido tema de debate, com ênfase nos dias de hoje, desde 1972, quando a imprensa nacional cunhou a expressão “Violência Urbana”, para caracterizar a repentina elevação do número de crimes triviais e a aceleração da criminalidade violenta (roubo, assalto, latrocínio, estupro, etc.).
A partir de então, acelerou-se uma inquietante e angustiante espiral de violência criminal, que conduziu nosso país a um vergonhoso recorde histórico em 2017, ano em que mais de 64 mil pessoas foram assassinadas e a taxa de mortalidade chegou a assustadores 30,9 por 100 mil habitantes. Por quê?
Ocorreu no Brasil, no período de 1968 a 1973, o chamado “milagre econômico brasileiro” – destacado crescimento econômico – caracterizado pela aceleração do crescimento do PIB (Produto Interno Bruto), forte industrialização e inflação baixa.
As notícias sobre o paraíso de consumo, em que se transformara a cidade grande, chegaram às cidades interioranas, provocando enorme deslocamento populacional. Em 1972, surge um atípico fenômeno: o esvaziamento do campo e o inchaço das capitais, ou seja, a população urbana ultrapassou a população rural.
As grandes cidades não estavam preparadas para receber esse grande fluxo de pessoas, o que gerou crises de moradia, seguridade, fome, miséria, educação, transporte, saneamento, desemprego, desocupação, concentração de renda, ou seja, a migração desordenada trouxe a explosão demográfica que gerou marginalização (à margem de direitos sociais) provocando crises sociais que, em alguns casos, evoluíram para a marginalidade (à margem de deveres sociais).
A inicialmente proclamada prosperidade fez eclodir o aumento da concentração de renda, de corrupção e de exploração da mão de obra, acentuando a desigualdade social, transformando, de latente para real, a figura do excluído, do marginalizado.
É muito comum, alguns pesquisadores atribuírem a essa vulnerabilidade socioeconômica a origem do crescimento da violência criminal. Certamente, um equívoco, se compararmos com outros países.
Essa comparação nos permite inferir que, dentre várias hipóteses, estaríamos diante de outra vulnerabilidade: a vulnerabilidade civil, a meia cidadania, onde são exigidos os direitos sociais, mas não são cumpridos os deveres sociais, isto é, os valores sociais não são respeitados e as regras sociais não são obedecidas.
Logo, a premissa de que a marginalização, a vulnerabilidade socioeconômica é responsável pelo aumento dos índices criminais não é correta, é, até mesmo, absurda.
Na discussão da insegurança é necessário o conhecimento sobre vulnerabilidades e ameaças. Vulnerabilidades seriam descontinuidades no tecido social, seriam falhas de Instituições, ensejando avanço de ameaças ao organismo social. Já as ameaças são adversidades, reais ou potenciais, advindas de forças da natureza, de antagonismos surgidos entre integrantes do próprio grupo ou entre grupos rivais, e de pressões, internas ou externas, que afetam diretamente a preservação ou a perpetuação da espécie humana ou que perturbam a vida social ou nacional.
Em razão do inesperado e do imponderável que cercam vulnerabilidades e ameaças, ou seja, nem sempre é possível saber quando irão ocorrer e/ou qual será extensão de cada uma, depreende-se que Segurança é uma utopia, sendo correto afirmar-se que se vive e sempre se viveu em um ambiente de insegurança. Não apenas no Brasil, mas em qualquer parte do mundo. Daí, a inexorabilidade da insegurança.
Diante dessa realidade fática, há uma sutileza que necessita ser mais bem observada, analisada e trabalhada: nenhuma ação é realizada para aumentar a segurança, mas, sim, para reduzir a insegurança, ou seja, as ações visam a diminuir a sensação de insegurança e, não, a aumentar a sensação de segurança.
*Amauri Meireles é coronel veterano PMMG, comandante da Região Metropolitana de Belo Horizonte e do 14º Batalhão em Ipatinga, membro do Instituto Brasileiro de Segurança Pública e membro da Academia de Letras Capitão PM João Guimarães Rosa