*Por Ramon Melo Fontich
O transporte coletivo de passageiros foi alçado pelo Estado à qualidade de serviço público essencial (art. 30, V, CR/88) – gênero que não foi atribuído nem mesmo aos serviços de saúde e educação. Tratando-se de serviço público essencial, a sua exploração por particulares se dá por meio de delegação formal, precedida de licitação e na quase totalidade dos casos, em exclusividade (art. 175, CR e 14 da Lei nº 8.987/95).
Na sequência, tornando-se vencedor do processo licitatório o particular se torna delegatário de serviço público, atraindo para si um regramento próprio, responsável por garantir a adequação do serviço à população, com vista a atender os princípios dos serviços públicos – especialmente, regularidade, universalidade, continuidade e garantia das gratuidades.
Com isso, o particular passa a executar diretamente o transporte coletivo de pessoas, com exclusividade no trecho, se vinculando a uma série de obrigações perante a administração pública, como por exemplo, renovação de frota, garantia de gratuidade no serviço a determinadas pessoas (v.g. idosos), pagamento de outorgas ao estado e pagamento de taxas sobre a receita da linha.
Por outro lado, em regramento oposto, é permitido a determinadas empresas, mediante licença prévia, o transporte por fretamento, que se consubstancia na contratação por um determinado grupo de pessoas com motivação comum (p. ex. ida a uma festa), com ponto de saída/retorno e horários pré-definidos.
Visando diferenciá-los, a Lei Estadual nº 19.445/2011 (MG), veda que o transporte por fretamento se assimile ao transporte coletivo de passageiros, proibida a fixação de itinerário ou horário regular para embarque e desembarque de passageiros, a lotação de pessoas, a venda de passagens e a cobrança de preço por passageiro e, especialmente, a realização de viagens habituais com regularidade de dias, horários e itinerários com venda individualizada de passagens .
Não obstante, mesmo com a clara distinção entre os dois serviços, o de caráter público (transporte coletivo) marcado pela venda individual de passagens com horários fixos, itinerários pré-definidos e oferecidos universalmente; e, por outro lado, o de caráter privado, marcado pela contratação de um grupo para consecução de determinada atividade; na prática, a distinção tem se mostrado um mero detalhe para aqueles que pretendem se passar como delegatários de serviço público.
Não é novidade que tem sido ofertado de maneira ampla, a venda de bilhetes de passagens rodoviárias por intermediadoras que não são concessionárias públicas, e tampouco prestam o serviço diretamente, mas subcontratam empresas cuja qualidade, segurança e pontualidade do serviço é desconhecida.
Tal modalidade de prestação de serviço público é na verdade, reconhecida como verdadeiro transporte clandestino, na medida que extrapola a natureza do transporte por fretamento.
Por esse motivo, a Lei Estadual nº 23.941/2021 (MG), previu sanções ao transporte clandestino, mediante a remoção do veículo e pagamento de multas. Neste caso, os consumidores desavisados serão “desembarcados e o veículo será recolhido ao depósito” (art. 7º, caput), em pleno desamparo.
No final das contas, o preço do desconhecimento é pago pelo consumidor. Ao contrário das empresas que atuam por fretamento, as concessionárias públicas são frequentemente vistoriadas para garantir a segurança e bom funcionamento dos veículos.
Aliás, estima-se que 40% (quarenta por cento) dos acidentes são causados por transporte clandestino. Por isso, é importante que usuário esteja atento para contratação das empresas regulares, capazes de fornecer uma viagem segura, confortável e confiável.
(*)Ramon Melo Fontich é advogado com atuação voltada para o contencioso. Possuo experiência em atuação de processos judiciais estratégicos, especialmente nas áreas de direito civil, imobiliário, empresarial e administrativo
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