Por Walter Biancardine (*)
Um ser humano normal – digamos, pré-digital e anterior ao gramscismo midiático parido por FHC – certamente ficaria perplexo ao observar que o pensamento e capacidade de análise política do brasileiro médio ainda não ultrapassou os padrões de torcidas de futebol apaixonadas, contaminados pela feia vaidade de só se discutir o que está na moda, o que é “in” e chique de comentar.
Para piorar, esta mesma vaidade impulsiona o direcionamento de se postar, nas redes sociais, os mesmos e repetitivos “hits” em busca de “views”, cliques, curtidas e compartilhamentos; fácil é concluir que não buscamos soluções e, sim, nosso exclusivo e egoísta sucesso na internet – o Brasil que se lasque.
Abre-se o X (antigo Twitter) e por lá somos levados a crer que o país inteiro se resume à cidade de São Paulo, pois que metade do que vemos limita-se ora a lamber, ora a ralar Pablo Marçal. A outra metade das postagens dedica-se a exigir, de modo furibundo, a cabeça daquele que “Não Se Pode Dizer o Nome”, temperada pela habilidade do Master Chef jornalístico Glenn Greenwald. E pára por aí.
E a reforma – ou melhor, “deforma” – tributária, que nos envergonhará ao sermos o país com a mais alta carga de impostos no planeta? E os incêndios criminosos, comprovadamente dolosos, que se espalham e devastam metade do território nacional? E a bombástica revelação – finalmente – do hacker, contratado para espionar os Bolsonaros e Adélio Bispo, que acusou Gilberto Kassab de ser seu contratante?
Sobre esta última revelação, silêncio inacreditável e absoluto. Ninguém aparenta desejar cobrar explicações de Kassab, e muito menos perguntar as razões do Secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite – bem como as do Governador Tarcísio de Freitas – em tratarem tal assunto com visível constrangimento e protelação.
Mesmo nos assuntos que afagam as vaidades internéticas, tais como o impeachment do “Inominável”, nenhuma voz se levantou para reclamar contra a absurda e distante data de 7 de setembro, dia marcado para as manifestações, exigindo que as mesmas acontecessem antes. Não, todos acataram bovinamente, posto que já fora marcada por galante personagem do YouTube, e ninguém ousou contrariá-lo.
Mas esta espécie de brasileiro médio não se satisfaz em ser ridículo, é preciso igualmente ser patético, e as diversas facções – torcidas futebolísticas – das redes sociais xingam-se mutuamente de serem “gado” de um ou outro personagem: uns acusam outros de obedecerem cegamente Jair Bolsonaro, enquanto outros acusam uns de, bovinamente, deixarem-se seduzir pela hipnose neurolinguística de Marçal. Em paralelo correm aqueles que se julgam mais “ponderados”, “superiores”, “elevados” mesmo e jamais – jamais! – ousariam postar algo que ninguém ainda postou, seja por covardia, ignorância, medo ou fanatismo. E que se danem o hacker, Kassab, incêndios, datas de manifestações ou os impostos escorchantes; o importante é ser chique e sofisticado.
Alguém normal, diante de tal estado mental de quase toda uma população concluirá, desesperançado, que nada mais terá jeito e que é inútil e inglório lutar. Compreensível, uma reação perfeitamente humana, mas é exatamente isso que o sistema quer: que você se conforme e desista.
As suas mãos, entretanto, são as únicas que poderão salvar o Brasil de um abismo, e esta é a realidade maior que todos evitam reconhecer e encarar: que tudo só depende de nós.
Cabe a você decidir o que postará em suas redes sociais, bem como opinar sobre a melhor data para manifestar-se ou lembrar, à um bando de ovelhas, que toda uma matilha de lobos está à espreita e todos devem ser combatidos – não apenas aquele que mais se destaca.
A democracia, definitivamente, é o regime de governo que mais trabalho e sacrifícios exige do povo, pois a liberdade está sempre às vésperas de sua extinção.
Acredite e trabalhe. Vale a pena.
(*) Walter Biancardine é jornalista, analista político e escritor. Foi aluno do Seminário de Filosofia de Olavo de Carvalho, autor de três livros e trabalhou em jornais, revistas, rádios e canais de televisão na Região dos Lagos, Rio de Janeiro