Por Wlliam Saliba
A cena foi emblemática e lamentável. Ganhou espaço nesta terça-feira em veículos da grande mídia brasileira.
Em plena praça pública em Coronel Fabriciano, na Região Metropolitana do Vale do Aço, o prefeito Marcos Vinícius Bizarro, exultante com a vitória do sucessor Sadi Lucca (PL), encontrou um jeito peculiar — e preocupante — de comemorar. Diante de uma multidão, Bizarro esmagou repetidamente uma lata de cerveja com o mesmo nome de sua ex-mulher, Stella Nunes, ex-candidata e mãe de sua filha.
A performance, além de misógina, simboliza o retrato de uma política que flerta com a violência de gênero, envergonha a sociedade e perpetua a discriminação contra as mulheres. Esse não foi apenas um gesto pessoal, mas um ato carregado de simbolismo, escancarando o nível de agressividade presente em setores da política brasileira.
Bizarro, cujo sobrenome reflete sua atitude, transformou a lata de cerveja numa metáfora repulsiva para atacar sua ex-companheira em público, sob o olhar de uma plateia que, em parte, aplaudiu a agressão velada. O fato de a marca da cerveja ter o nome da ex-mulher, Stella, não é uma mera coincidência, mas um ataque calculado, embebido de rancor e violência simbólica.
A eleição em Coronel Fabriciano, que viu Sadi Lucca sair vitorioso com 68,52% dos votos, deveria ter sido um momento de união, de renovação política, de respeito pelas divergências democráticas. Contudo, o episódio lamentável que marcou a comemoração ressoou nacionalmente como um retrocesso nos valores que deveriam nortear o comportamento de figuras públicas.
No lugar de uma transição tranquila de poder, o que vimos foi um ataque machista, em plena luz do dia, em uma sociedade que ainda luta para erradicar as múltiplas formas de violência contra a mulher.
A ex-esposa de Bizarro, Stella Nunes, que concorreu à prefeitura, publicou uma nota de repúdio contundente. Em suas palavras, deixou claro que o gesto não fere apenas a sua dignidade pessoal, mas ataca todas as mulheres.
A cena fez sua filha chorar e sua mãe lamentar. Com razão, Stella denuncia a perpetuação da misoginia e da violência de gênero que ainda persiste na política — e na sociedade. Seu manifesto vai além do desabafo pessoal: é um chamado para a sociedade refletir sobre o quanto ainda aceitamos, muitas vezes de maneira passiva, esses ataques disfarçados de “brincadeira”.
A misoginia não é uma questão isolada em Coronel Fabriciano. Trata-se de um problema estrutural, presente em diversos setores da sociedade, incluindo a política. Quando um prefeito em exercício utiliza sua posição para fazer uma exibição pública de agressividade contra a ex-mulher, isso sinaliza que a violência contra as mulheres não apenas é tolerada, mas pode ser celebrada por alguns.
Tal episódio, gravado e divulgado nacionalmente pela grande mídia, coloca em evidência a persistente cultura do machismo na política brasileira, onde atos como esse ainda encontram respaldo entre eleitores e, infelizmente, parte da população.
O exemplo de Stella Nunes, que denunciou o ataque e rechaçou qualquer tentativa de normalizar o gesto, é um farol de esperança para muitas mulheres que enfrentam situações semelhantes, mesmo que em contextos menos públicos.
Bizarro, ao esmagar a lata com o nome de sua “ex”, ultrapassou todos os limites de respeito, ética e dignidade que deveriam guiar a conduta de um representante do povo. Mais do que uma cena bizarra, o episódio é sintomático de uma doença social mais profunda, que precisa ser tratada com urgência: a normalização da misoginia.
Há um ditado que diz: “a liberdade de um termina onde começa a do outro”.