Por William Saliba
O promotor Cristiano Cassiolato, da 10ª Promotoria de Justiça de Ipatinga, recebeu ontem (21/10) uma denúncia contra a Prefeitura de Ipatinga, apresentada pelo presidente do Instituto Cidades, André Tenuta. O documento aponta irregularidades no Contrato Nº 133/2022, firmado entre o município e o Consórcio CFP, representado pela P. Avelar Consultoria e Serviços Eireli, no âmbito de uma Ata de Registro de Preços da Associação dos Municípios do Médio São Francisco (AMMESF).
A representação destaca falhas no processo de adesão à ata de registro, irregularidades nos pagamentos e a ausência de deliberação por parte do Conselho Municipal de Habitação, desrespeitando a legislação municipal que regula as ações de regularização fundiária. Segundo a denúncia, o contrato em questão, avaliado em R$ 15 milhões, tinha como objeto a regularização fundiária de 15 mil unidades habitacionais de interesse social no município.
ALEGAÇÕES DE IMPROPRIEDADE
O contrato em questão é apenas um dos diversos firmados entre a prefeitura e a empresa P. Avelar, todos através de adesões a atas produzidas por outras entidades, como a AMMESF e o Codanorte (Consórcio Intermunicipal para o Desenvolvimento Sustentável do Norte de Minas). A prática de adesão a atas de registro de preços permite que o município contrate empresas sem a necessidade de realizar novas licitações, mas a representação questiona a legalidade da aplicação deste mecanismo, afirmando que ele foi utilizado de forma indevida para contornar processos licitatórios obrigatórios.
O Instituto Cidades alega que o contrato, que previa o pagamento de R$ 1.000,00 por cada unidade habitacional regularizada, foi assinado sem que houvesse uma deliberação do Conselho Municipal de Habitação, órgão responsável pela gestão e aplicação dos recursos do Fundo Municipal de Habitação de Interesse Social, conforme previsto na Lei Municipal Nº 2399/2007. Além disso, aponta que a última Conferência de Habitação, que deveria definir as diretrizes da política habitacional, ocorreu em 2017, e que o conselho atual, responsável por validar as decisões, estava com seu mandato expirado desde 2019.
VIOLAÇÃO DE NORMAS
A denúncia levanta ainda a questão dos pagamentos realizados à empresa P. Avelar. De acordo com o documento, o primeiro pagamento de R$ 1 milhão foi efetuado em 14 de dezembro de 2022, no mesmo dia em que o Conselho de Habitação tomou conhecimento da existência do contrato e supostamente analisou um “plano de ação”. O segundo pagamento, de valor idêntico, foi realizado apenas duas semanas depois, em 28 de dezembro de 2022, totalizando R$ 2 milhões pagos antes de qualquer serviço ser devidamente acompanhado e fiscalizado.
A representação ressalta que esses pagamentos ocorreram sem a devida verificação da qualidade do serviço prestado, pois o contrato estipula que a empresa é remunerada após o protocolo do registro dos imóveis no cartório, sem qualquer responsabilidade pelo acompanhamento ou correção de eventuais discrepâncias no material protocolado. Esse procedimento, de acordo com a denúncia, é inadequado e pode resultar em prejuízos para os beneficiários do programa de regularização fundiária, que podem não receber os títulos de propriedade esperados.
A irregularidade do processo é destacada pela ausência de participação do Departamento de Habitação e pela assinatura do contrato pelo Procurador Geral do Município, Breno Inácio da Silva, o que, segundo a legislação, seria competência do Secretário Municipal de Planejamento. O promotor Cassiolato deve agora avaliar as alegações, que envolvem suspeitas de fraude, má gestão dos recursos públicos e desrespeito à legislação municipal. O caso também coloca em evidência a importância de uma fiscalização rigorosa e transparente em contratos de grandes valores que impactam diretamente na vida de milhares de famílias de baixa renda.
O impacto social e financeiro dessas falhas pode ser significativo, considerando o caráter sensível do programa de regularização fundiária, cujo objetivo é proporcionar segurança jurídica para ocupações urbanas informais. A falta de cumprimento das normas estabelecidas, especialmente em um projeto de tal magnitude, pode comprometer o acesso à moradia digna de milhares de pessoas, além de criar um ambiente de desconfiança na administração pública local.
Serviço:
Os anexos da representação podem ser baixados no endereço: https://drive.google.com/drive/folders/1eCBxpc2SAktGgLEJd2IzD1ATSwvDsGL3?usp=sharing