Por Edmundo Polk Fraga (*)
Como entusiasta do automobilismo, recebi com surpresa a notícia de que o Autódromo Internacional Virgílio Távora, localizado em Eusébio, na Região Metropolitana de Fortaleza, será leiloado. Inaugurado em 1969, esse espaço icônico do esporte brasileiro agora enfrenta um futuro incerto, reflexo de décadas de falta de investimentos e ausência de planejamento estratégico.
Por outro lado, o Autódromo de Guaporé, no Rio Grande do Sul, que também iniciou suas atividades em 1969, segue um caminho oposto. Em plena fase de revitalização, o equipamento gaúcho destaca-se pela gestão eficiente e pela constante modernização. Segundo a imprensa, seus gestores têm garantido não apenas a realização de eventos de grande porte, mas também o fortalecimento da economia regional, que se beneficia do turismo e das atividades promovidas pelo autódromo.
Esse contraste não é apenas uma curiosidade regional; ele revela uma questão estrutural no Brasil: a relevância de políticas públicas consistentes e da gestão estratégica para preservar patrimônios esportivos e culturais. Enquanto o autódromo cearense se transforma em símbolo de abandono, Guaporé demonstra como planejamento, investimento e o engajamento da comunidade podem transformar um espaço esportivo em motor de desenvolvimento econômico e social.
Ao refletir sobre essa disparidade, lembro-me de Ipatinga, em Minas Gerais, minha cidade natal. Aqui, diversas iniciativas promissoras foram abandonadas ao longo dos anos, como as pistas de vaquejada e bicicross, que já foram consideradas as melhores do Brasil. Esses fracassos evidenciam a importância de uma visão integrada entre infraestrutura, gestão e participação comunitária para evitar o desperdício de investimentos públicos e o enfraquecimento de patrimônios regionais.
Em 1982, tive a oportunidade de ser cofundador do Kart Clube Ipatinga. Começamos modestamente, improvisando corridas em uma pista de bicicleta abandonada. Apesar das limitações, os eventos atraíam multidões aos domingos, transformando o espaço em um verdadeiro ponto de encontro comunitário. Posteriormente, fundamos a primeira escola de pilotagem de Minas Gerais, a Escola de Kart Ayrton Senna da Silva. Essa iniciativa ampliou a conexão com a população e formou jovens pilotos, muitos deles campeões estaduais e nacionais.
Essas experiências reforçaram uma lição fundamental: não basta construir infraestruturas grandiosas. O sucesso de projetos esportivos e culturais está diretamente ligado à capacidade de envolver a comunidade. Quando a população se sente parte de um projeto, ele se torna sustentável, gerando um ciclo virtuoso de receitas, empreendedorismo, geração de empregos e fortalecimento econômico local.
Exemplos como o projeto “Educando com Música e Cidadania”, desenvolvido desde 2002 em Atibaia, São Paulo, ilustram essa dinâmica. A iniciativa começou de forma modesta nas escolas municipais, com pequenas fanfarras, e cresceu ao longo dos anos com o apoio da Associação de Pais e Amigos da Fanfarra Municipal de Atibaia (Fama). Hoje, a cidade se orgulha de ter uma das melhores bandas do mundo, que recentemente conquistou a medalha de ouro no Campeonato Mundial de Bandas e Fanfarras, na Alemanha.
Esse sucesso só foi possível graças ao trabalho contínuo de envolver jovens a partir dos 7 anos, por meio de fanfarras mirins nos bairros de Atibaia. A combinação de cultura, educação e incentivo comunitário foi crucial para transformar um projeto tímido em um exemplo internacional de excelência.
O Brasil possui um potencial imenso, mas carece de visão estratégica e comprometimento com a preservação e valorização de seus patrimônios. O destino de espaços como o Autódromo Virgílio Távora e o sucesso de iniciativas como o Fama mostram que o futuro depende de escolhas claras e de esforços conjuntos entre governo, gestores e comunidade.