O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) entrou com uma Ação Civil Pública (ACP) contra o prefeito de Ipatinga, a empresa P. Avelar Consultoria e Serviços, o consórcio CFP e vários servidores municipais. Eles são acusados de atos de improbidade administrativa relacionados ao uso inadequado do Sistema de Registro de Preços (SRP) e da Adesão a Ata de Registro de Preços fora das condicionantes legais. A Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público de Ipatinga também pede que eles, juntamente com onze secretários, ex-secretários e um procurador adjunto, sejam condenados a pagar danos morais coletivos.
Para os secretários, ex-secretários e procurador-adjunto do município, foi estipulado valor de R$ 297 mil em danos morais coletivos. Para o prefeito, a quantia chega a R$ 499 mil. E para a empresa P. Avelar, o dono dela, e o consórcio CFP, a Promotoria de Justiça pediu a condenação solidária em R$ 8,6 milhões.
Na ACP, o Ministério Público pede, ainda, a imediata suspensão dos contratos firmados entre o município de Ipatinga, a empresa P. Avelar e o consórcio CFP, decorrentes de adesão em ata de registro de preço n.º 73/2021, n.º 84/2021, n.º 110/2021 e n.º 133/2022. Também é solicitada a indisponibilidade dos bens da empresa, do seu dono e do consórcio na quantia de R$ 43 milhões, valor dos quatro contratos.
Na ACP, a Curadoria de Patrimônio Público questiona o modelo usado pelo município para a contratação de obras e serviços, o que estaria ocorrendo fora das regras legais. “Basicamente, a gestão municipal empreendeu, ao longo do tempo, e dolosamente, três modelos de práticas ilícitas relacionadas ao Sistema de Registro de Preços (SRP)”, afirma o representante do MPMG.
IRREGULARIDADES
Entre as irregularidades, estão: deflagração de procedimento fora das hipóteses de utilização; instauração de registro de preços quando o objeto demandaria licitação; adesão em ata de registro de outros entes e, especialmente, consórcios públicos e privados sem qualquer pertinência com o município de Ipatinga, sem comprovação concreta da viabilidade jurídica, sem observância do procedimento adequado e sem comprovação concreta da economicidade do ato.
O SRP é instrumento auxiliar da licitação usado pela Administração Pública para selecionar proposta mais vantajosa, em relação à aquisição de bens e à realização de serviços. É um método de compra usado em itens de rotineira aquisição e utilização corrente. Por meio dele, a administração não precisa manter grandes estoques de produtos e bens ordinários, nem deflagrar procedimento licitatório para cada compra ou realização de serviço comum. Assim, é medida de eficiência e de economicidade.
Entretanto, segundo a ACP, o sistema está sendo utilizado, sem a observância dos requisitos, e para contratações de serviços complexos ou especializados. “No âmbito da legislação atual, os serviços ou obras a serem contratados via SRP devem ser aqueles considerados comuns, padronizáveis, de reiterada necessidade da administração, como pequenas reformas, pinturas, obras simples”.
Mas, segundo o Promotor de Justiça, o que se viu ao analisar o caso, à título de exemplo, foi a contratação, por R$ 15 milhões, da empresa P. Avelar, por meio de adesão (carona) a Ata de Registro de Preços, para execução do complexo projeto de REURB, de regularização fundiária dos 14 bairros mais populosos do município, e que envolve, no mínimo, 16 mil unidades imobiliárias. Outras obras e serviços complexos também foram citados na ACP como de contratação irregular.
Além disso, os contratos decorrentes do SRP não poderiam sofrer acréscimo nos quantitativos previstos na ata de registro de preços. “Todavia, a esmagadora maioria dos contratos frutos das adesões fraudulentas realizadas pelo município de Ipatinga foram acrescidos, apostilados, aditados e prorrogados, muitas das vezes, pelo dobro da contratação inicial, em nítida afronta à normatização de regência, municipal e federal”, afirma o representante do MPMG.
“O que se observa, portanto, é que os demandados – guiados por interesses escusos – praticamente substituíram, por meio de verdadeira estruturação de esquema fraudulento, a regra constitucional da licitação padrão pelas adesões a Atas de Registro de Preços sem qualquer observância dos critérios legais”, afirma a ACP.
Ainda de acordo com a ACP, “o profundo conhecimento da gestão municipal a respeito dos contornos do expediente em questão possibilitou a realização de complexos procedimentos, dissimulando-se o objeto contratado em publicações, diluindo as contratações entre secretarias e pulverizando a responsabilização com a já conhecida e reiterada prática de substituição de secretários municipais ao longo do expediente”.
Também é questionado na ACP como a P. Avelar conseguiu contratos milionários com o município, uma vez que o balanço patrimonial da empresa demonstrava que, no período de 1 de janeiro a 31 de dezembro de 2020, a folha de pagamento de empregados foi de apenas R$ 5.620,00. E no ano seguinte, em 2021, a P. Avelar assumiu obrigações com o município no importe de até R$ 80 milhões.
“A flagrante inobservância dos requisitos para a realização do procedimento de adesões em ata ora questionados, somados à incisiva prática de atos de favorecimento da empresa P. Avelar e, inclusive, o escamoteamento dos verdadeiros objetos contratuais (em sua complexidade) destacam o dolo dos demandados em propiciar o enriquecimento ilícito de terceiros (beneficiando-os com os contratos espúrios), bem como a intenção de fraudar a licitude de procedimento licitatório, frustrando o caráter competitivo do procedimento licitatório e privilegiando a empresa contratada”.
Na ACP, a Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público de Ipatinga também pede à Justiça que condene o prefeito, os secretários e ex-secretários e o procurador adjunto do município ao pagamento de multa civil de até 24 vezes o valor da remuneração percebida pelos agentes, entre outras sanções.
Para a empresa P. Avelar, é pedida a perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, o pagamento de multa civil equivalente ao valor do acréscimo patrimonial e a proibição de contratar com o poder público por até 14 anos, entre outras sanções.