Por Natália Brito (*)
A arquitetura, mais do que uma arte, é um reflexo da sociedade. A cada ano, o Prêmio Pritzker celebra aqueles que contribuem significativamente para essa expressão, e em 2025 o reconhecimento foi concedido ao arquiteto chinês Liu Jiakun. Criado em 1979 pela Fundação Hyatt, nos Estados Unidos, o Prêmio Pritzker é a mais alta honraria da arquitetura, frequentemente comparado ao Nobel da área. Ele reconhece profissionais cujo trabalho tem impacto notável no ambiente construído e na qualidade de vida das pessoas.
Com uma trajetória marcada pelo respeito à tradição e a reinvenção dos espaços urbanos, Jiakun se destaca por sua abordagem humanista e socialmente engajada. Ao contrário de muitos laureados anteriores, cujas assinaturas arquitetônicas são marcadas por uma estética exuberante e um traço autoral inconfundível, Liu Jiakun prefere a simplicidade inteligente, o uso de materiais locais e a valorização do cotidiano. Suas obras não se impõem ao entorno, mas dialogam com ele. O arquiteto se consagrou ao projetar edifícios que, mais do que monumentos, são espaços de convivência e resistência cultural.
Sua obra mais emblemática, o West Village, em Chengdu, exemplifica essa filosofia. Um complexo multifuncional que, ao invés de se elevar como um arranha-céu reluzente, abraça a comunidade ao seu redor. Jiakun projeta com a sensibilidade de quem compreende que a arquitetura não deve apenas servir à função estética, mas também transformar vidas. Seu uso inovador de materiais acessíveis, sua atenção às necessidades dos cidadãos e sua defesa por espaços inclusivos fazem dele um nome indispensável na arquitetura contemporânea.
O reconhecimento pelo Prêmio Pritzker vem em um momento crucial, onde a arquitetura muitas vezes se rende à ostentação e ao consumo de luxo. Em contraste, Liu Jiakun nos lembra que a verdadeira inovação está em criar soluções sustentáveis e socialmente relevantes. Em um mundo onde os espaços urbanos estão cada vez mais privatizados e excludentes, sua abordagem coloca as pessoas no centro do projeto, dando-lhes voz e pertencimento.
No entanto, esse prêmio não é apenas uma celebração de sua trajetória, mas também um chamado à reflexão. Até que ponto a arquitetura tem cumprido seu papel social? Estamos projetando cidades para as pessoas ou para as grandes corporações? O trabalho de Liu Jiakun mostra que é possível aliar tradição e modernidade, estética e funcionalidade, sem perder de vista o essencial: o impacto humano.
O legado de Liu Jiakun se consolida como um farol para uma nova geração de arquitetos. O Pritzker de 2025 não premia apenas um nome, mas um pensamento. E se há algo que a arquitetura precisa hoje, mais do que nunca, é resgatar seu compromisso com a sociedade.
Natália Brito é arquiteta e professora mestre, com 15 anos de experiência na área de projetos e 12 anos dedicados à educação. Ela possui a Formação DAP (Desenvolvimento Avançado de Projetos) e é cofundadora da Arqcalc, uma startup de Precificação de Projetos. Através de plataformas digitais, mentora milhares de profissionais da Arquitetura e Design, ajudando-os a aprimorar suas práticas e gestão.