Nesta quarta-feira (9) é celebrado o Dia Mundial da Imunização. Para falar sobre a data é preciso fazer uma pequena viagem no tempo para relembrar os caminhos que fizeram com que as vacinas se tornassem produtos de Saúde desejados e seguros.
No início dos anos 1900, a poliomielite, também conhecida como paralisia infantil, teve seus primeiros registros no Brasil. A acadêmica de enfermagem e estagiária do Serviço de Segurança e Saúde do Trabalhador (SSST) da Fundação Ezequiel Dias (Funed), Isadora Nepomuceno, conta que, durante as décadas de 1960 e 1970, foram feitas algumas tentativas de instituir a vacinação de crianças contra a doença, mas sem resultados satisfatórios.
Somente na década de 1980 o Ministério da Saúde e a Organização Mundial da Saúde (OMS) organizaram um plano de vacinação para a redução da poliomielite. Foi instituído o Dia Nacional de Vacinação, que obteve grande adesão por parte da população. “Estudos mostram que, em 1980, foram registrados 1.290 casos da doença. Após a vacinação nacional de crianças, em 1981, esse número foi reduzido para 122 e, em 1982, foram apenas 45 casos”, aponta Isadora.
Com a continuidade dessa estratégia, o Brasil recebeu da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), em 1994, o certificado que informava que o país estava livre da poliomielite.
Patrícia Ferreira Boasquivis, farmacêutica do Serviço de Desenvolvimento de Produtos Biológicos (SDPB) da Funed, lembra que essa certificação foi um ganho para o Brasil, mas que ela não representa a erradicação da doença. Quatro regiões do mundo são certificadas como livres da pólio – Américas, Europa, Sudeste Asiático e Pacífico Ocidental, mas ainda existem casos no continente africano e, por isso, as ações de vacinação precisam ser permanentes.
“A OMS traz um dado muito interessante: desde 1988, mais de 18 milhões de pessoas podem andar, pois sem a imunização teriam ficado paralisadas, e 1,5 milhão de mortes infantis foram evitadas graças à vacina contra a poliomielite. Isso reforça a eficácia e a importância da vacinação”, afirma Patrícia.
Esse foi apenas um dos muitos casos de sucesso obtidos após ações de imunização efetivas. Entretanto, é importante entender que os bons resultados não foram por acaso ou coincidência, mas por aplicação da ciência.
COMO AS VACINAS FUNCIONAM
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), as vacinas contêm partes enfraquecidas ou inativadas de um determinado organismo (antígeno) que desencadeiam uma resposta imunitária do corpo. As mais recentes são compostas pela matriz para produzir antígenos, e não pelo próprio antígeno.
Micaella Pereira Costa, acadêmica que também é estagiária de enfermagem do SSST, faz uma ressalva importante: “Independentemente de uma vacina ser constituída pelo próprio antígeno ou pela matriz, essa versão enfraquecida não causará a doença na pessoa, mas desafiará seu sistema imunitário a responder como teria feito na sua primeira reação ao verdadeiro agente patogênico”, afirma.
A vacinação não só reduz as chances de um surto ou epidemia, mas também evita que a pessoa vacinada seja contaminada por uma doença potencialmente fatal, impedindo assim internações e gastos públicos em grande escala, com hospitais, medicamentos, tratamentos e potenciais reabilitações. “Estamos vivenciando neste momento o exemplo da Covid-19, no qual, em muitos casos, há necessidade de os pacientes passarem por fisioterapia pulmonar. A vacinação não somente poupa gastos financeiros, como também representa uma forma de autocuidado e bem-estar fundamental”, acrescenta Micaella.
REAÇÃO EM COMUNIDADE
Embora a imunização seja feita individualmente, as vacinas não foram pensadas considerando-se apenas a proteção de indivíduos de forma isolada, mas de comunidades inteiras. A maioria das doenças evitáveis por vacina é transmitida de pessoa para pessoa, pelo contato com objetos contaminados ou quando o doente espirra, tosse ou fala, pois ele expele pequenas gotículas que contêm os agentes infecciosos, como é o caso da Covid-19.
A infecção pessoa a pessoa se espalha quando um transmissor entra em contato com uma pessoa suscetível. Se o transmissor só entrar em contato com indivíduos imunes, a infecção não vai além do caso inicial e é rapidamente controlada. Micaella lembra que essa cadeia de transmissão humano a humano pode ser interrompida, mesmo que não haja 100% de imunidade de certos grupos, porque os casos transmissores não têm contatos infinitos.
“É a conhecida ‘imunidade de rebanho’ ou ‘proteção da comunidade’, que é um benefício importante da vacinação. De qualquer forma, todos precisam se esforçar para se vacinar, para compensar a parte da população que, por motivos de saúde, não pode se imunizar”, reforça.
DESAFIOS
Mesmo diante das estatísticas positivas, a imunização ainda enfrenta importantes barreiras a serem transpostas. Uma delas é a hesitação em se vacinar. A OMS listou esse fator como uma das dez maiores ameaças à saúde global no ano de 2019. A farmacêutica do SDPB da Funed, Patrícia Ferreira Boasquivis, explica que a hesitação à vacina ocorre em um cenário em que há disponibilidade de imunizantes.
“O fator cultural é ainda mais evidente quando se avaliam comunidades específicas, separadamente: enquanto a cobertura vacinal contra o sarampo atinge a marca de 91,5% nos Estados Unidos (ainda abaixo do limite de 95% estabelecido pela OMS para o estabelecimento da imunidade de rebanho), entre alguns grupos religiosos ela chega apenas a 60%”, aponta.
Patrícia lembra, ainda, que o sarampo é o principal exemplo das consequências do impacto da hesitação à vacina. “Estudos mostram que muitos países que estavam perto de erradicar a doença estão assistindo ao ressurgimento do sarampo enquanto a cobertura vacinal cai. Isso não foi diferente para a Covid-19: as campanhas de vacinação contra a doença têm focado não somente na eficácia e na segurança dos imunizantes, mas também na sua aceitação entre as populações, que ainda não atingiu os níveis ideais em diversas nações”, acrescenta a farmacêutica.
DIREITO DE TODOS
A imunização é um direito humano, além de ser um componente fundamental da atenção primária. Poucas medidas em saúde pública podem ser comparadas ao impacto das vacinas, pois elas reduzem doenças, incapacidades e mortes por uma variedade de doenças infecciosas.
Conforme dados da OMS, atualmente, existem vacinas para a prevenção de mais de 20 doenças fatais, evitando, assim, cerca de 2 a 3 milhões de mortes todos os anos por males como difteria, tétano, coqueluche, influenza e sarampo.