Por William Saliba
Aos 55 anos de jornalismo, é impossível não se espantar com a metamorfose das redações. O que era sinônimo de isenção e ética parece ter dado lugar a uma nova era de “jornalismo adjetivado”. Em meio a crises, a velha imprensa reencontrou seu propósito, talvez com o receio do retorno da velha censura, o “temível cala boca” que nos anos 60 e 70 atormentou às redações.
A experiência tem seu valor e para um jornalista veterano, cada ano de carreira traz uma nova perspectiva sobre o ofício. Com cinco décadas e meia de vivência na profissão, a visão sobre o jornalismo atual é uma mistura de nostalgia e crítica. Antigamente, o papel do jornalista era claro e objetivo: apurar fatos com precisão, ouvir todas as partes envolvidas e publicar com imparcialidade. Mas o cenário mudou, e o que vemos agora é um jornalismo que muitas vezes se deixa guiar por sensacionalismo e viés.
No passado, o jornalismo era um bastião da ética e da clareza. As redações prezavam pela qualidade da informação, e a palavra escrita tinha um peso considerável. Os adjetivos eram usados com parcimônia, e a ideia era relatar os fatos sem adornos desnecessários. No entanto, com a chegada da era Bolsonaro, o panorama mudou drasticamente. O que antes era um jornalismo neutro e investigativo passou a ser transformado em um campo de batalha de narrativas.
A grande imprensa começou a adotar o que poderíamos chamar de “jornalismo adversativo”. Em vez de relatar os eventos de maneira neutra, os veículos de comunicação passaram a utilizar advérbios e conjunções para colorir os fatos de acordo com a narrativa desejada. “Mas”, “porém” e outras palavras similares se tornaram protagonistas nos títulos e subtítulos das notícias, na maioria das vezes desfavorecendo ações e resultados positivos do governo.
Essa prática deu lugar a um novo estilo: o “jornalismo adjetivado”. Nessa modalidade, a objetividade foi substituída por uma linguagem carregada de adjetivos e adjetivações. Manifestações populares foram rotuladas como atos terroristas, e quem defendia valores conservadores era rapidamente tachado de bolsonarista ou fascista. A linha entre reportar e editorializar se tornou tênue, e a imparcialidade foi para o fundo do baú.
No entanto, jornalismo é cíclico; e a recente onda de denúncias sobre abusos e inconstitucionalidades perpetradas por figuras radicais parece ter trazido um sopro de renovação. A velha imprensa, diante da ameaça de censura e controle, parece estar recobrando sua essência. A preocupação com a liberdade de expressão e o direito à informação está reacendendo o compromisso com a ética jornalística.
Em meio a uma paisagem política tumultuada e uma sociedade polarizada, o verdadeiro desafio é encontrar um equilíbrio entre reportar os fatos e evitar cair na armadilha do sensacionalismo.
Afinal, muitas redações ainda enfrentam pressões e limitações que afetam a liberdade de imprensa.
Para o ditado “Gato escaldado tem medo de água fria”, vale a pena relembrar o bordão eternizado pelo humorístico “Sai de Baixo”:
– Cala a boca Magda!