Por Natália Brito (*)
Em tempos de moradias cada vez mais padronizadas e impessoais, o uso de tecidos no design de interiores ressurge como uma poderosa ferramenta para imprimir identidade, acolhimento e funcionalidade aos ambientes. Cortinas, estofados, forros e até paredes revestidas demonstram que a decoração pode ir além da estética, ao oferecer conforto acústico, sofisticação e até um sutil comentário sobre como vivemos e nos relacionamos com os nossos espaços.
É curioso observar como os tecidos — materiais aparentemente simples e antigos — voltam a ocupar papel de protagonismo na arquitetura de interiores contemporânea. Em meio a uma onda crescente de ambientes neutros, linhas retas e soluções industrializadas, a presença de tramas naturais, texturas quentes e estampas ousadas pode representar mais do que um capricho decorativo: é um gesto político. Sim, porque em um mundo cada vez mais automatizado, afirmar o conforto, a personalidade e a individualidade nos espaços de habitação é também uma forma de resistência.
Quando se pensa em design de interiores, poucos materiais têm a capacidade de transformar tanto um ambiente quanto os tecidos. Seja no estofado de uma poltrona, no revestimento acolchoado de uma parede ou em um forro de teto delicadamente drapeado, o tecido tem o poder de trazer à tona sensações esquecidas — a memória do toque, o som abafado do silêncio, a leveza de um ambiente bem tratado. Essas sensações, frequentemente negligenciadas em projetos focados apenas na funcionalidade, são essenciais para a criação de espaços verdadeiramente habitáveis.
É também preciso considerar o aspecto funcional que os tecidos oferecem. Tecidos pesados em cortinas ajudam na proteção térmica e acústica, algo essencial em cidades barulhentas e apartamentos com pouca privacidade. Já os tapetes e almofadas não apenas contribuem esteticamente, como ajudam a definir zonas de conforto, facilitando a convivência e o bem-estar. Em um cenário de moradias compactas, onde cada centímetro conta, o tecido se adapta, modula e embeleza — muitas vezes com baixo custo e alto impacto visual.
Mas o uso dos tecidos também exige cuidado. Não se trata de sobrecarregar os espaços com materiais, mas de usá-los com inteligência. A escolha do tecido certo para cada aplicação pode mudar completamente a leitura do ambiente. Um linho cru em uma poltrona sugere leveza e frescor, enquanto o veludo escuro reforça sofisticação e introspecção. Na parede, um revestimento têxtil pode criar isolamento acústico e ainda aquecer visualmente o ambiente, tornando-se um recurso tanto estético quanto técnico. E nos forros de teto, onde poucos ousam inovar, tecidos translúcidos criam uma atmosfera etérea e intimista, muito distante da frieza das lajes expostas.
Apesar disso, ainda existe resistência. Em muitos projetos, especialmente os voltados à habitação popular, os tecidos são os primeiros a serem retirados sob o argumento de custo ou manutenção. É uma lógica perversa que ignora a importância do conforto sensorial — e do direito a uma moradia digna, que vá além do concreto básico. O tecido, nesse contexto, pode representar uma democratização do bem-estar: materiais acessíveis, criativos e transformadores, capazes de romper a monotonia da padronização arquitetônica.
Diante disso, é preciso refletir: que espaços estamos criando para viver? A estética da funcionalidade extrema, tão promovida nos últimos anos, tem nos afastado da ideia de lar como abrigo emocional. Retomar o uso consciente dos tecidos é, portanto, uma forma de reumanizar os interiores. É um convite a desacelerar, a tocar, a sentir — e, sobretudo, a construir ambientes que reflitam quem somos de fato.
Ao fim, mais do que tendência, o uso de tecidos no design de interiores é um retorno ao essencial. Um gesto sutil, mas profundamente transformador. Uma prática que, quando bem orientada, devolve à arquitetura sua função mais nobre: acolher o humano em sua totalidade.